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Um dos momentos mais bizarros da vida dos pais é quando os filhos iniciam o processo de aprendizagem da leitura. É uma loucura. A pipa, o pato, a patita, o pau, a pata deixam de ser palavras banais, que raramente usamos, e passam a ser barreiras. Barreiras electrificadas e com arame farpado.
Normalmente é assim: a criança chega a casa com uma missão enviada pela professora: ler e copiar a frase: "É a patita do pato." Problema: a criança não sabe ler nem escrever. Começo logo a suar. Conto até dez e peço a todos os santinhos que me iluminem nesta hora de tormento e que protejam o meu filho da inevitável crise de nervos que irá decorrer dentro de dois/três minutos. De seguida abraço a missão com coragem, empenho e sacrifício.
"Vamos lá: diz patita." Ele diz patita. "Agora pato." Ele repete. "E agora lê esta palavra" - aponto para a patita. Ele diz pato. "Não", digo eu, e soletro patita. Ele soletra. "Agora lê a palavra." Resposta: pato. "Não... pato é a outra, esta palavra é patita." Ele responde com a convicção de quem não está a perceber nada: "Pois." Vamos lá outra vez: "Pa-ti-ta". Ele repete. "Pa-ti-ta." "Boa!" Passo para a outra palavra: "E esta?" Ele olha e responde radiante: "Patita!" O meu coração deu um salto. "Não..." Corrijo, agora num tom ameaçador, "patita é a outra, esta é pato. Diz lá pa-to." Resposta: "Pau." Pau... Foi por um triz que não desatei aos gritos.
Lembro-me sempre desta tarde quando ajudo os meus filhos a estudar. Desde então que só os ajudo, não tento ensinar-lhes nada. E eles lá vão aprendendo a ler e a escrever.